domingo, 11 de julho de 2010

O Escalo-do-Mira está em perigo de extinção


Parente da carpa e do pimpão, o escalo-do-mira merece toda a atenção e cuidados, não pelo seu interesse económico, pela utilização culinária, pela sua aparência fulgurante ou até pelo tamanho... apenas porque só existe em Portugal e está em vias de extinção.

O famosíssimo rio Mira nasce na serra do Caldeirão, no Algarve, e vai até à povoação dos três erros: nem é vila, nem é nova, nem tem mil fontes - Vila Nova de Mil Fontes. No período estival em que nos encontramos o seu caudal quase não existe. Nesta época, a água circunscreve-se aos poços mais fundos do leito, os pegos, e aí se refugiam em luta pela sobrevivência os exemplares de uma espécie única no mundo e que só existe aí - o escalo do Mira.

O escalo-do-mira merece toda a atenção e cuidados, não pelo seu interesse económico, pela utilização culinária, pela aparência fulgurante ou até pelo tamanho, mas porque está em vias de extinção e é uma peça do património que merece ser preservada.
Pertence à família dos ciprinídeos, aquela que é considerada a maior e mais importante família dos peixes de água doce, parente, entre outros, da carpa e do pimpão, e também conhecido como um robalo. Atinge o tamanho de 16 cm de comprimento, tem uma longevidade máxima de seis anos, alimenta-se de invertebrados, atinge a maturidade sexual ao fim de dois anos e faz uma postura de cerca de dois mil ovos (mais precisamente 1928).

O principal problema do escalo-do-mira é que ocorre num habitat muito reduzido. "Tem uma área de distribuição muito restrita o que faz com que em termos de ameaças as coisas corram relativamente mal", explica ao DN Pedro Raposo de Almeida, investigador do Instituto de Oceanografia da Universidade de Ciências de Lisboa e professor na Universidade de Évora.

Em determinados Verões, devido às elevadas temperaturas, os cursos de água da bacia hidrográfica do rio Mira passam a regimes intermitentes e formam poças interrompidas. "Esses pegos são zonas extremamente stressantes para os animais: além das temperaturas elevadas, há um grande aglomerado de peixes", salienta Pedro Raposo de Almeida.

O oxigénio vai faltando, os peixes entram quase em dormência e o escalo, indefeso, é presa fácil dos seus inimigos naturais: lontras, cágados, saca-rabos e cegonhas. Naturalmente, a protecção de algumas espécies [lontra, cegonha] , exerce sobrepressão numa espécie já em dificuldades de sobrevivência. "Não conhecemos o efeito que a protecção de uma espécie pode ter nas outras", refere Pedro Raposo de Almeida.

Numa sequência de anos secos, a população fica muito fragmentada e a resistência da espécie a ameaças e factores de pressão externa diminui drasticamente. "Os animais deixam de ter capacidade de se adaptar às condições do ambiente onde estão inseridos", diz o biólogo. E acrescenta: "Como é uma zona de actividade agrícola, quando há seca as pessoas têm tendência a utilizar os pegos para retirar água para a rega e os peixes sem água não sobrevivem."

Para equilibrar o desaparecimento da espécie, já foi tentada a reprodução em cativeiro para posterior repovoamento da bacia hidrográfica do Mira. "Mas é complicado fazer em cativeiro o que a natureza faz no seu estado selvagem. Os animais não podem ser libertados em estado precoce porque são imediatamente predados. Se são mantidos em cativeiro muito tempo, ficam condicionados à forma como são alimentados e têm depois dificuldade em procurar alimento e também em fugir de predadores", esclarece o citado investigador.

Fonte: Diário de Notícias

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