João Menezes, antigo presidente do Instituto para a Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB), faz um balanço desastroso do modelo do ambiente na última década: «O que se tem feito no ambiente é o caminho para a irrelevância», afirma. Para este especialista, aqueles que tinham sido os grandes motores do ambiente nas últimas décadas - água e resíduos - foram perdendo peso: «Hoje, tirando as águas residuais, onde ainda há 30 por cento por fazer no país, o problema está resolvido e, por isso, as nossas empresas ou vão para o estrangeiro ou não têm alternativas. Ou se consegue passar da gestão da oferta para a gestão da procura ou dificilmente daqui se sai».
Ora, o que isto tem revelado, afirma João Menezes, é uma «incapacidade de ter uma proposta de valor para a sociedade e depois o apropriamento por alguns interesses que existem por captura do Estado na área do ambiente», dando exemplos de escândalos ligados ao ambiente, como o caso Face Oculta ou o Freeport, para concluir que «não há estratégia para o ambiente, mas sim uma apropriação do Estado».
Na opinião do especialista, a evolução natural do sector será no sentido da privatização. «Uma das alternativas é vender as empresas públicas, especialmente a Águas de Portugal. A curto prazo, qualquer governo vai ter que ter em conta que o maior player do ambiente tem que ser privatizado», concretiza.
João Menezes insiste que «qualquer modelo tem que passar por se tirar o Estado – local, central, regional – da empresa. Faria sentido apenas deixar o Estado na parte da regulamentação ambiental e abrir os activos públicos a privados com contrapartidas, como a inovação e criação de novos negócios».
Isto permitiria repensar novas estratégias, viradas para a redução de custos e com a ecoeficiência, a energia e a reabilitação do parque de edifícios e como vectores fundamentais. «Se o sector se mantiver focado no planeamento, desaparece. Mas se for mais do que o Estado, e sim um driver onde as empresas se posicionam, podemos criar valor para o ambiente», afirma João Menezes.
Esta é, aliás, na opinião do antigo presidente do ICNB, uma questão fundamental na evolução do sector na próxima década: a diminuição do papel do Estado e a criação de valor. «Deveríamos tornar o sector do ambiente quase como um segundo Ministério da Economia, tal como os alemães fazem. Desta forma haveria um valor acrescentado às empresas, já que o Ambiente é um vector de capacidade de inovação e diferenciação», considera, exemplificando: «este governo tem apostado nas renováveis, mas se tivesse feito do ambiente o driver central, o plano das barragens não teria sido aprovado sem ter acoplado, no mínimo, um plano de eficiência. Ou seja, claramente estamos numa óptica de greenwashing, ambiente como folclore».
João Menezes confessa que «ficava contente se a próxima governação (no sentido global e não de governo) fosse capaz de pensar o ambiente como uma oportunidade para gerar valor e não restrições». Por isso, apela a uma mudança de paradigma na forma como se encara o Ambiente, que, considera, tem que ser assumido pelas empresas como principal motor de inovação e diferenciação.
Até porque, na próxima década, para enfrentar os dois grandes desafios internacionais – a perda de biodiversidade e as alterações climáticas –, João Menezes identifica a necessidade de fazer a ponte entre biodiversidade e economia: «o grande desafio é conseguir encontrar negócios que justifiquem uma visão mais economista da biodiversidade». Para além disso, há que evoluir de uma visão ambiental (desenvolvida noutro século, motivada pela luta contra a poluição) para uma visão ecológica, em que se explica às empresas que «há ganhos a pensar no capital natural e isto é decisivo para ter outra abordagem do ambiente e da tecnologia», conclui João Menezes.
Autor: Névia Vitorino/Portal Ambiente
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