É um maná em vias de desaparecer. Parente da popular sardinha e da espinhosa savelha, o sável é um gigante com as características de toda a família: gordo, saboroso e espinhoso. É também caro e raro na gastronomia, pois só é pescado nos finais do Inverno.
Vive no mar, a peneirar toneladas de água para engolir apenas o zooplâncton. Geralmente em Março, dirige-se para as embocaduras dos rios, em cardumes gigantescos, e sobe-os para a desova. Nessa viagem fluvial é capturado para se tornar o pitéu de muitos apreciadores.
As diversas práticas culinárias de preparação do sável provocam avalanches de sofredores de gula a acorrer aos festivais e centros tradicionais de preparação do bicho, um pouco por todo o País. A pesca do sável é, portanto, um importante recurso económico, mas ao mesmo tempo contribui para uma diminuição dos efectivos populacionais e coloca em risco a continuidade da espécie.
Para alguns apreciadores, quanto mais a montante for pescado, mais é apreciado. "O sável chega aos rios bastante gordo e todo o processo de subida é feito contracorrente, transpondo barreiras e desenvolvendo as gónadas. Daí que, muitos o prefiram comer quando capturado mais a montante, já em condições de atleta", explica Pedro Raposo de Almeida, professor da Universidade de Évora e investigador no Centro de Oceanografia da Faculdade de Ciências de Lisboa.
No nosso país, a subida dos rios está actualmente dificultada e muitas vezes até impossibilitada. A construção de barragens e de açudes, responsáveis pela interrupção das rotas migratórias, são a ameaça mais séria à espécie, classificada "em perigo" pelo Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal. "Quando chega aos rios, o sável traz reservas energéticas para a migração e para a reprodução. Ao entrar, deixa de se alimentar. Se gastar as reservas energéticas a ultrapassar barreiras, o processo de reprodução torna-se mais difícil", salienta Pedro Raposo de Almeida.
Se anteriormente à construção das barreiras, o sável e a sua congénere ocupavam nichos de reprodução diferentes, reproduzindo-se o sável mais a montante, actualmente dá-se muitas vezes uma sobreposição das áreas de desova das duas espécies. O aparecimento de híbridos, geralmente estéreis, leva também a uma quebra da população.
Como é frequente em muitas espécies, a grande maioria dos sáveis adultos morre depois de reproduzir. "Os juvenis têm de regressar ao mar, mas é complicado direccioná-los para as passagens construídas para o efeito nas barragens", alerta o investigador do Instituto de Oceanografia. Muitos juvenis não acedem às passagens e são sorvidos, acabando por morrer nas turbinas.
Pedro Raposo de Almeida alerta que "é necessário assegurar a continuidade longitudinal das áreas de reprodução da espécie, criando mecanismos eficazes de transposição de barreiras e assegurando um fácil regresso dos juvenis". O investigador refere que "algumas coisas têm de ser feitas a nível nacional, como a avaliação do estado das populações (através dos levantamentos das capturas) e o condicionamento da pesca em determinados locais e alturas do ano".
Apesar de existir pouca informação sobre os efectivos populacionais do sável, sabe-se que nos últimos anos a espécie tem sofrido uma acentuada redução. "Em Portugal, é das espécies que é possível que estejam mais ameaçadas em termos de conservação. É importante que não se esgote um recurso que é de todos", salienta Pedro Almeida.
Extremamente sensível, o sável entra facilmente em stress, acabando por morrer, o que torna a sua manipulação deveras complicada.
Fonte: Diário de Notícias
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