quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Das Pedras de David aos Rochedos de Golias

Vigilantes da Natureza: Das Pedras de David aos Rochedos de Golias

O vigilante, do latim vigilantis, é um profissional que protege. Neste sentido, pergunto-me: haverá bem mais precioso para proteger que a própria Natureza? 

Foi com esta questão retórica que no passado fim-de-semana, entre 1 e 4 de Fevereiro, estive em representação do PAN, como comissária política nacional, no XXI Encontro Nacional de Vigilantes da Natureza, que se realizou em Cascais e em Sintra. Esta experiência foi gratificante por múltiplos motivos. Por um lado, tive a oportunidade de conhecer de modo mais técnico os desafios e as soluções destes profissionais e, por outro, tive o privilégio de privar com as pessoas e não apenas com os números que estas representam. Conheci uma faceta muitas vezes escondida dos decisores políticos: a do relacionamento humano em cenários informais. 


Não descurando os valiosos contributos partilhados e inúmeras necessidades que estes profissionais têm, que são mesmo bastantes (fardamento, deslocações em trabalho, progressões na carreira, idade média de cada profissional, etc.), estar e sentir com tão dignos profissionais e humildes pessoas fez-me reafirmar a necessidade de trabalharmos, todos os dias e de um modo mais afincado, para dignificar esta profissão, garantindo também que o seu saber-fazer no terreno e no contacto com as populações não se perca. 


Os dramáticos incêndios do ano passado recordaram-nos da importância, óbvia, de pensarmos e ordenarmos a floresta com uma visão de continuidade para centenas de anos, e expôs, tragicamente, a urgente necessidade de apostar nestes profissionais que acima de tudo previnem danos e crimes ambientais.


A nível nacional, desde que entrámos no Parlamento, e desde o primeiro Orçamento do Estado (OE), temos promovido, infrutiferamente, o aumento efetivo e objetivo destes profissionais como método preventivo. Atualmente existem apenas 119 Vigilantes da Natureza e no último OE o Governo incluiu a contratação de mais 30 profissionais. Porém, estes números estão muito aquém dos necessários. O PAN defende que o número de efetivos deveria ascender no mínimo a 525 profissionais, tanto no continente como nos arquipélagos. 


Às propostas de reforço dos Vigilantes da Natureza, não só do número, mas dos meios, o Governo tem sempre alegado os elevados custos. Mas que custos humanos, sociais, económicos e ambientais tem o país com os incêndios todos os anos? 


Parece-me que a pergunta se responde por si só. Infelizmente, denoto que, mais uma vez, o Governo vai pelo caminho inverso ao da prevenção, preferindo apostar no combate a posteriori. Recordo, por analogia, o investimento de Espanha. Por exemplo, em Andaluzia, um território com uma dimensão semelhante a Portugal, existem cerca de 900 vigilantes, sendo que em todo o país existem à volta de 7.000 profissionais nesta área.


Este incremento ajudaria também à preservação e à expansão da biodiversidade local e regional, como foi bem expresso neste encontro. Exemplo das dificuldades atuais é a impossibilidade de expansão territorial do único casal das Águias de Bonelli do parque natural Sintra/Cascais. Acresce a este fenómeno, de míngua das áreas protegidas e vigiadas, a falta de corredores ecológicos entre áreas protegidas ou áreas verdes entre municípios, medida presente noprograma eleitoral do PAN em Cascais e que esperamos ver acolhida neste mandato. Falta a visão para ordenar o território de forma integrada, pensando em todas e todos e não apenas no crescimento económico e urbano. 


Por justeza, não posso deixar de mencionar o empenho e o contributo dos municípios de Cascais e Sintra, através dos seus executivos, para a realização deste encontro nacional. Sem dúvida que é uma aposta ganha e que esperamos que continue a ser feita por ambos.


Termino agradecendo o trabalho desenvolvido pela Associação Portuguesa de Guardas e Vigilantes da Natureza na sensibilização da sociedade civil para a importância desta profissão. Com os seus parcos recursos, os poucos Vigilantes da Natureza em Portugal enfrentam um desafio incomensurável: com “pequenas pedras” combatem “enormes rochedos” da destruição antrópica. Em suma, a Natureza, ou o que resta dela, precisa dos seus Vigilantes, e estes precisam do esforço de cada um/a de nós para que também elas/eles não desapareçam juntamente com as nossas florestas e a sua biodiversidade.


SANDRA MARQUES

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