Perante a ordem de um tribunal brasileiro para abandonar uma fazenda próximo do território dos seus antepassados, cuja demarcação pedem há vários anos, os índios da tribo Guarani-Kaiowá, formada por 50 homens, 50 mulheres e 70 crianças, informaram por carta que preferem morrer.
As comunidades Guarani-Kaiowá são originárias Pyelito Kue/Mbarakay-Iguatemi-MS, território que foi ocupado por fazendeiros que o têm guardado por homens armados. Os índios pedem há vários anos a demarcação das terras ancestrais e instalaram-se há cerca de um ano nas margens do rio Hovy, próximo do seu território original, de onde agora se veem forçados a sair pela justiça brasileira.
Numa carta remetida ao Conselho Indigenista Missionário, a tribo diz que recebeu a informação de que a comunidade “será atacada, violentada e expulsa da margem do rio pela própria Justiça Federal, [do município] de Navirai”, entendendo que a decisão da Justiça Federal, faz “parte da ação de genocídio e extermínio histórico” do “povo indígena, nativo e autóctone do Mato Grosso do Sul”. Assim sendo, os Guarani-Kaiowá afirmam que perderam “a esperança de sobreviver dignamente e sem violência” no seu antigo território, e que já não acreditam na justiça brasileira”.
Na impossibilidade de reaver o seu território ancestral de Pyelito Kue/Mbarakay, onde estão enterrados os seus “avôs, avós, bisavôs e bisavós” e onde se situam os “cemitérios de todos os antepassados” declaram querer morrer e ser enterrados junto aos mesmos, como pode ler-se na missiva: “pedimos, de uma vez por todas [ao Governo e Justiça Federal], para decretar a nossa dizimação e extinção total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para jogar e enterrar os nossos corpos (…) visto que decidimos integralmente a não sairmos daqui com vida e nem mortos”.
No seu sítio online, o jornal Estadão, noticiou ontem que os índios já “cantam, dançam e rezam no idioma nativo” há dez dias, “confirmando a disposição de suicídio coletivo” e que “soldados da Força Nacional e agentes da Polícia Federal acompanham a movimentação como observadores e atentos para atuar em qualquer emergência”.
Carta da comunidade Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay-Iguatemi-MS para o Governo e Justiça do Brasil
Nós (50 homens, 50 mulheres e 70 crianças) comunidades Guarani-Kaiowá originárias de tekoha Pyelito kue/Mbrakay, viemos através desta carta apresentar a nossa situação histórica e decisão definitiva diante de da ordem de despacho expressado pela Justiça Federal de Navirai-MS, conforme o processo nº 0000032-87.2012.4.03.6006, do dia 29 de setembro de 2012. Recebemos a informação de que nossa comunidade logo será atacada, violentada e expulsa da margem do rio pela própria Justiça Federal, de Navirai-MS.
Assim, fica evidente para nós, que a própria ação da Justiça Federal gera e aumenta as violências contra as nossas vidas, ignorando os nossos direitos de sobreviver à margem do rio Hovy e próximo de nosso território tradicional Pyelito Kue/Mbarakay. Entendemos claramente que esta decisão da Justiça Federal de Navirai-MS é parte da ação de genocídio e extermínio histórico ao povo indígena, nativo e autóctone do Mato Grosso do Sul, isto é, a própria ação da Justiça Federal está violentando e exterminado e as nossas vidas. Queremos deixar evidente ao Governo e Justiça Federal que por fim, já perdemos a esperança de sobreviver dignamente e sem violência em nosso território antigo, não acreditamos mais na Justiça brasileira. A quem vamos denunciar as violências praticadas contra nossas vidas? Para qual Justiça do Brasil? Se a própria Justiça Federal está gerando e alimentando violências contra nós. Nós já avaliamos a nossa situação atual e concluímos que vamos morrer todos mesmo em pouco tempo, não temos e nem teremos perspectiva de vida digna e justa tanto aqui na margem do rio quanto longe daqui. Estamos aqui acampados a 50 metros do rio Hovy onde já ocorreram quatro mortes, sendo duas por meio de suicídio e duas em decorrência de espancamento e tortura de pistoleiros das fazendas.
Moramos na margem do rio Hovy há mais de um ano e estamos sem nenhuma assistência, isolados, cercado de pistoleiros e resistimos até hoje. Comemos comida uma vez por dia. Passamos tudo isso para recuperar o nosso território antigo Pyleito Kue/Mbarakay. De fato, sabemos muito bem que no centro desse nosso território antigo estão enterrados vários os nossos avôs, avós, bisavôs e bisavós, ali estão os cemitérios de todos nossos antepassados.
Cientes desse fato histórico, nós já vamos e queremos ser mortos e enterrados junto aos nossos antepassados aqui mesmo onde estamos hoje, por isso, pedimos ao Governo e Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/expulsão, mas solicitamos para decretar a nossa morte coletiva e para enterrar nós todos aqui.
Pedimos, de uma vez por todas, para decretar a nossa dizimação e extinção total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para jogar e enterrar os nossos corpos. Esse é nosso pedido aos juízes federais. Já aguardamos esta decisão da Justiça Federal. Decretem a nossa morte coletiva Guarani e Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay e enterrem-nos aqui. Visto que decidimos integralmente a não sairmos daqui com vida e nem mortos.
Sabemos que não temos mais chance em sobreviver dignamente aqui em nosso território antigo, já sofremos muito e estamos todos massacrados e morrendo em ritmo acelerado. Sabemos que seremos expulsos daqui da margem do rio pela Justiça, porém não vamos sair da margem do rio. Como um povo nativo e indígena histórico, decidimos meramente em sermos mortos coletivamente aqui. Não temos outra opção esta é a nossa última decisão unânime diante do despacho da Justiça Federal de Navirai-MS.
Atenciosamente, Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay
Fontes: colunas.revistaepoca.globo.com, www.estadao.com.br, www.dailymail.co.uk, e blogapib.blogspot.com.br, Naturlink/Filipa Alves
Foto: Reuters
0 comentários:
Enviar um comentário