Num estudo sobre o litoral de Gaia que fiz em 1981, escrevia “Corre-se, a curto prazo, o perigo de ver o mar avançar sobre áreas de estabelecimentos humanos, com os consequentes riscos e prejuízos.” Caso não se preservasse o que ainda restava de cordão dunar.
A natureza já nos dava razão, mas não faltaria muito para ser mais expressiva, no Inverno de 1989/90, quando o mar galgou o Cabedelo do Rio Douro e entrou pela barra, fustigando o Passeio Alegre e Massarelos.
Novamente em 1991 o mar provocou sérios prejuízos e “sustos”; num artigo que então publiquei chamava à atenção para a necessidade de proteger o cordão dunar, e denunciava os enrocamentos e paredões que nada resolvem.
Temos que perceber que o litoral não é uma linha como os mapas mostram, mas sim uma faixa. A elevação do nível do mar, a diminuição dos sedimentos transportados pelos rios, a destruição das dunas e arribas e os enrocamentos e paredões, são os principais fatores que afetam o litoral, de acordo com a generalidade dos investigadores.
Destaco a destruição do cordão dunar, defesa natural do continente contra o avanço do mar. Em alguns casos as dunas foram destruídas mas o espaço ainda lá está, sendo possível a sua reconstituição com recurso a técnicas simples, já usadas no princípio do séc. XIX.
No litoral de Gaia é bem patente o papel que tiveram nos recentes temporais essas técnicas, podendo ver-se grandes extensões de regeneradores dunares, bem carregados de areia, a constituírem barreira eficaz ao avanço da ondulação.
Com o objetivo de proteger as dunas do pisoteio dos veraneantes, criaram-se, a partir dos anos oitenta, passadiços sobrelevados em madeira, perpendiculares ao mar, que permitem o acesso às praias.
Mas a recente moda de instalar passadiços paralelos ao mar é responsável, agora, por uma das maiores faturas das destruições feitas pelo mar. Os passadiços perpendiculares são muito menos afetados, enquanto que dos segundos o mar “cobrou” quilómetros.
Embora sejam muito agradáveis para passear, é altura de corrigir os erros, e retirar esses passadiços paralelos ao mar para zonas menos vulneráveis, sob pena de anualmente se gastarem milhões.
É altura de repensar a localização de alguns apoios de praia e bares, mesmo licenciados pelos POOCs, que estão a desafiar a natureza, a ponto de alguns não terem resistido.
Devemos atender ao papel fundamental das defesas naturais e reinstalar campos de dunas nos espaços vagos ao longo da costa areosa e, mesmo, desocupar espaços para este fim, pois há que ter presente que os peritos estimam que o nível do mar possa subir cerca de 50 cm até ao ano 2050 e que os fenómenos meteorológicos excecionais e violentos venham a ser mais frequentes.
A faixa litoral deve constituir uma almofada que amorteça o impacto do oceano; isso sabe o povo desde há muito e, por isso, as cidades e vilas costeiras, sempre se estabeleceram no interior dos estuários, como foi o caso do Porto ou Vila Nova de Gaia até ao séc. XIX.
É o hábito de ir à praia, que se desenvolveu entre nós na segunda metade do séc. XIX, que faz aparecer casas de veraneio na Granja ou na Foz, não mais parando o crescimento urbanístico. Agora estamos a ver as consequências que no futuro poderão ser piores se não soubermos agir preventivamente face às alterações em curso.
Nuno Gomes Oliveira
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